14.6.05

Ausência de Anita Lascívia é o Teu Nome

E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as. Ef 5:11

"Anita está mexendo com a imaginação de ninfetas e cinqüentões. Homens maduros e meninas adolescentes vão ter seu universo imaginário povoado por novas possibilidades de relacionamento, até aqui jamais admitidas como aceitáveis".

Eu fico tentando fazer uma leitura sensata da crítica acima, espalhada por toda a mídia (com essas palavras ou com esse sentido), e me pergunto se há algum senso crítico nela. Na verdade, acho que há muito eufemismo e... verdade! Afinal, o que significa a expressão "mexer com a imaginação"? Para quem assistiu a algum capítulo, fica claro: a minissérie induz homens adultos, casados e pais de família a sonhar (e, se possível, tornar realidade) com uma aventura parecida com a que ele assiste na telinha. Já as adolescentes são estimuladas a olhar de um modo diferente, "esperançoso", para desconhecidos com idade para ser seus pais. "Está ficando super normal, hoje em dia".
Nesse momento, fica claro que mexer com a imaginação é um eufemismo, no lugar da surrada "tentação". A "Presença de Anita" é uma peça de erotismo até então proibido para a televisão. Com cenas que a mídia mesma chama de "tórridas". Mas o que ela não faz por "ibope"?
Eu não assisti à minissérie. Optei pela ausência de Anita. Mas abri uma exceção: o último capítulo. Por uma razão simples: conhecendo a história, eu sabia que, no final, o autor do livro traria o resultado de toda aquela liscenciosidade. O cinqüentão morreira queimado, na casa da ninfeta.
Pensei assim: quero ver como a TV fará para transformar a punição em vitória. Como ela fará para desfazer a lição maior: o resultado de tanta loucura. Pois conseguiu. Produziram um incêndio físico-erótico-espiritualista, no qual o protagonista arde por fora e por dentro. Por fora, perece no incêndio que reduz o casarão a cinzas; por dentro, morre em plena loucura sexual com uma aparição que o convence que é real, por meio de um beijo de virar do avesso, e o arrasta para cama, num clima tão quente que bastaria para pôr em chamas a cama e a casa em que estavam.
Mas e a esposa do lobo? Ah, tadinha! — Agora, os novelistas estão em apuros. Eles parecem não saber como transpor a idéia original de uma figura digna e discreta, situada em 1948, para os dias de hoje. Pintam uma personagem quase idiota, que não sabe dar o troco com seu personal trainer ou mesmo com o porteiro do prédio. Não está na história original. Fica, então, como bobona, mesmo. Como traduzir, para os dias de hoje, a dignidade de uma mulher traída que se cala, na tentativa de proteger os filhos?
Confesso que, ao participar de rodinhas masculinas, no trabalho, cheguei a ficar com vontade de dar uma olhadinha com um olho só (caso seja pecado, cometo apenas metade). Mas veio-me à mente um verso da Palavra: "bem aventurado é aquele que não se condena nas coisas que aprova" (Rm 14:22b). E pensei: toda a indústria moderna, inclusive a da pedofilia, sobrevive dessa inocente atitude de não dizer não. É só o que o "ibope"quer. Uma aprovação tão sutil que nem molesta nossa consciência cristã. Afinal, "fantasiar não faz mal a ninguém". Não percebemos que já não "detestamos o mal" (Rm 12:9b). Ao contrário, convivemos "democraticamente" com ele, como se não fôssemos do mesmo material inflamável que o cinqüentão e a ninfeta. Preferimos o lusco-fusco dos eufemismos: "somos adultos, e não há nada de mal em nos permitirmos fantasias que temperem nosso casamento". Afinal, é só um filme; são só fantasias. — Afinal, disse alguém, é só uma maçã.
(Rubem Amorese)

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