15.1.05

Será que Ele existe? Ou o debate em torno do Cosmos e do Caos.

Colaboração de Samuel Nunes
O geneticista galês, Steve Jones, esteve recentemente em Portugal para lançar o seu último livro “Y – A Descendência do Homem”. Basicamente a ideia central do livro resume-se ao facto do sexo começar como uma relação de parasitismo, e o gene masculino Y estar em guerra aberta constante, com o gene feminino X – a genuína guerra dos sexos. Posto isto, Steve Jones chega à conclusão de que os machos irão desaparecer daqui a uns confortáveis 10 milhões de anos (ufa, que alívio!). O pensamento de Jones é fascinante e daria para um artigo espectacular aqui ou em qualquer parte do mundo. Todavia, foi uma frase sua mais rudimentar que me despertou a atenção. Cá vai: “A ciência não consegue responder à pergunta que os filósofos e as crianças fazem: porque estamos aqui, qual o sentido da vida, como nos devemos comportar? A genética nada tem a dizer acerca do que nos torna mais do que máquinas motorizadas pela biologia. Nada nos diz sobre o facto de sermos humanos.” Pensando nestas questões cheguei à conclusão de que a ciência, na realidade, não tem muitas das respostas às perguntas mais pertinentes da existência. Ora vejamos!

1 - A ciência nada diz sobre o porquê da existência do universo
A 1ª e a 2ª lei da termodinâmica dizem-nos que houve um momento em que surgiu a energia, a matéria e o espaço. Mas assim que chegamos ao ponto em que a física deixa de operar, a ciência cala-se. Não explica nem descreve a origem das coisas. Stephen Hawking revela: “embora a ciência consiga resolver o problema de como o universo começou a existir, não resolve a questão de porque é que ele se dá ao trabalho de existir?”

2 – A ciência nada diz sobre a razão de existirem leis naturais
A ciência existe e funciona, como disciplina, porque as leis naturais são consistentes e fidedignas. Os cientistas assumem que essas leis são válidas, consistentes e previsíveis. Mas porque é que elas são assim? Porque não impera o caos? Porque não se instala a anarquia? A ciência responde com um sonoro silêncio. Deixem-me apresentar-vos Beatriz: a Barata Bombardeira. A Beatriz é uma barata que quando é atacada por um predador, geralmente uma aranha ou um sapo, responde com uma descarga explosiva de gás tóxico a alta pressão: POFFF!!! No seu bojo corporal a Beatriz tem 2 compartimentos perfeitamente estanques onde armazena químicos altamente voláteis, como hidro fosfatos e quininos. Estes juntam-se, quando a natureza chama, em combinações exactas numa câmara de combustão, e são expelidos por canais em tudo idênticos aos canos duma espingarda. Ora, se reinasse o caos no sistema Terra, a Beatriz poderia já ter desaparecido por mau funcionamento. Mas a verdade é que Beatriz, a Barata Bombardeira, continua em actividade e nunca fez um erro ao cozinhar os ingredientes voláteis da sua defesa explosiva. Nem chegou lá por tentativas de evolução, senão há muito teria explodido até à sua própria extinção.

3 – A ciência nada diz sobre a afinação detalhada do universo
A actual busca desesperada de vida inteligente em Marte, baseada em minúsculos espelhos de água, só revela um reconhecimento de que o nosso planeta tem condições especiais para a existência da vida. Para que o planeta azul, a Terra, tenha vida como tem, é necessário uma combinação cuidadosa e complexa de factores terrestres e extra-terrestres. A velocidade de rotação da terra, a inclinação do seu eixo, a distância do sol, tudo tem de ser milimétrico para que a vida possa existir. O carbono tem de ser na quantidade certa e o oxigénio também. 1cm cúbico a mais ou a menos seria fatal para os nossos pulmões. Só é possível tal exactidão com um arquitecto por detrás.

4 – A ciência nada diz sobre o nosso carácter humano
A ciência não consegue explicar porque é que somos humanos e não meras máquinas. Porque somos seres emotivos e não andróides. A ciência nada diz sobre os mistérios mais profundos da vida, como a desigualdade social, a teimosia do mal ou a desfaçatez dos poderosos.

5 – A ciência nada diz sobre o funcionamento do cérebro e o porquê dele funcionar assim
Basta ler a obra de António Damásio para chegar a esta conclusão. Peter Atkins, eminente cientista, diz que “o cérebro é o instrumento mais maravilhoso do universo”. E depois acrescenta que “as decisões mentais são ajustamentos de moléculas dentro das células cerebrais”. Mas, se a produção do pensamento humano nada mais é do que químicas e impulsos electro-nervosos, como é que qualquer ideia poderá ser significativa e racional? Como poderemos confiar em qualquer conclusão produzida pelos homens dos “ajustamentos moleculares”? Incluindo a afirmação de que o pensamento é mera química molecular.

6 – A ciência nada diz sobre a qualidade de vida
A tecnologia, a deusa da nossa sociedade, toca na nossa forma de estar na vida, em termos de saúde (espectacular os avanços nas operações intra-uterinas), conforto (adoro os sumiês), e comunicação (que seria de nós sem as mensagens SMS?), mas nada acrescentam às qualidades internas da vida em si. Os problemas da ganância, do egoísmo e do terrorismo podem ser descritos pela ciência com uma precisão matemática, mas não podem ser resolvidos por essa mesma ciência.

7 – A ciência nada diz sobre ética
Nos anos recentes têm-se registados muitos avanços nas áreas da socio-biologia e das ciências comportamentais. Avanços determinantes. No entanto, ficam por explicar as essências da justiça, da liberdade, da beleza, da estética, da satisfação e da paz. A ciência não diz nada sobre a forma da nossa consciência actuar nestas áreas fundamentais. Ou seja, não conseguimos saltar dos átomos para a ética, nem das moléculas para a moral.

Por isso pergunto: o que nos impede de resvalar do cosmos para o caos? Os crentes dirão: Deus. Os ateus dirão: ????? Eu prefiro uma solução a uma não solução. Mesmo aqui a ciência nada diz. A ciência não consegue provar a não existência de Deus, simplesmente porque é impossível provar uma negação universal. Para tal acontecer teria de ser possível ter todos os factos do universo na mão. Como isso não acontece, então a existência de Deus é uma possibilidade intrínseca. Deus não pode ser descartado à partida. Para mais, vivemos num cosmos em vez dum caos. E a prova é que este texto faz sentido, senão seria a balbúrdia completa.

Samuel Nunes

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